Já montou móveis do IKEA aí em casa? Se sim, deve conhecer os manuais da marca sueca, tão poupados em palavras. Confia-se que, tirando o sentido dos bonecos, sejamos capazes de montar uma estante de 5 prateleiras que não se abata sob o peso dos volumes do Guerra e Paz.
Agora, imagine que está a montar essa estante já com uma enorme enxaqueca, daquelas que toldam a visão. Já nem consegue olhar para o manual.
Dava jeito ter instruções junto aos bonecos para que alguém lhe pudesse ler o passo seguinte, certo? É esse o espírito do texto alternativo.
O que é texto alternativo?
O texto alternativo, ou alt text, descreve o significado e o contexto de um elemento visual para transmitir a informação que ele contém. É inscrito no código da página, sendo invisível para a maioria dos utilizadores.
Mas não para todos.
Pense em quem navega com leitores de ecrã ou softwares de comando por voz, mas também em quem não vê os elementos visuais porque, por acesso limitado à internet, não carregaram.
Escrever este texto garante que todos os utilizadores conseguem aceder ao significado dos elementos visuais.
Todas as imagens precisam de texto alternativo?
As imagens decorativas não precisam de descrição porque não trazem significado relevante ao conteúdo da página. Escrever um texto alternativo para essas imagens tornaria mais demorada a navegação com leitor de ecrã, porque obrigaria os utilizadores a passar por informação desnecessária ao tentar cumprir o seu objetivo.
Imagens decorativas são um dos 7 tipos de imagens listados pela Web Accessibility Initiative (WAI). Vamos focar-nos noutro: imagens informativas.
O texto alternativo de imagens informativas passa o conceito principal ali representado, ou seja, a sua razão de existir naquele ponto da experiência.
Por exemplo, numa página de contactos, um número de telefone pode ser apresentado com o ícone de um telefone. O seu texto alternativo diria “telefone” para identificar a forma de contacto correspondente àquele número.
10 dicas para escrever texto alternativo acessível
Se é verdade que nem todas as imagens requerem alt text, também é certo que não basta escrever qualquer texto só para preencher o atributo “alt”. Mas como escrever um bom texto alternativo, se sempre ouvimos dizer que uma imagem vale mais que mil palavras?
1. Conhecer o propósito
O que faz esta imagem aqui? Faça a pergunta em voz alta. Perceber o objetivo de uma imagem é meio caminho para conseguir descrever o seu significado e relevância para o contexto.
Conte ao seu colega do lado o que se passa naquela imagem e tome nota dos pormenores que descreve. O que estão as pessoas a fazer naquela fotografia? Como interagem? Que emoções saltam à vista?
Assim, será fácil perceber se a imagem precisa de texto alternativo e quais os detalhes que não podem ficar de fora.
Nas suas recomendações sobre acessibilidade digital, a Universidade de Harvard mostra 3 versões diferentes do texto alternativo da mesma imagemde um estádio:
a) sem considerar o contexto, o alt text seria “um estádio vazio”,
b) numa página sobre os resultados de provas para corrida em pista, o alt text seria “2 atletas sobem os degraus do estádio de Harvard”,
c) já numa página sobre obras de renovação, o alt text seria “estádio de Harvard com rachas nos pilares de betão”.
2. Escrever pouco é sempre regra
A concisão é uma das primeiras palavras que UX writers aprendem ao escrever para a experiência dos utilizadores. É também um dos 4 pilares de que falamos no curso de UX Writing da Tangível Academy.
Já sabemos que o texto alternativo pode ser apenas uma palavra, como “telefone”. Pode ser uma frase ou mesmo um conjunto de frases, desde que breves e simples.
Podíamos dizer que o texto alternativo é uma forma de microcopy. Por isso, escrevemos, neste campo, descrições e palavras curtas, com ideias simples e diretas.
3. Texto para motor de busca ver?
O texto alternativo também é indexado pelos motores de busca. Mas isso não significa que se deva usá-lo para melhorar a classificação no Google.
Devemos escrever texto alternativo específico e rigoroso, mesmo que isso signifique não incluir mais algumas keywords boas para SEO.
4. Garantir transparência
De facto, o texto alternativo não serve para esconder informação, mesmo que isso beneficie o desempenho de SEO.
Pense num botão. Se é verdade que devemos escrever sempre botões claros, com verbos orientados à ação específica pedida aos utilizadores, então o seu texto alternativo deve seguir as mesmas regras — com ainda mais foco na especificidade.
Para cancelar uma subscrição, o botão “visível” na interface pode dizer “cancelar”, se estiver perto do contexto da subscrição e as consequências dessa ação forem claras. No lado “invisível” da interface, o texto alternativo do botão pode ser reforçado como um “cancelar subscrição”.
5. Considerar o contexto é chave
Descrever o que se passa numa imagem passa por explicar o que ela faz naquele momento de uma página ou de um ecrã.
Por exemplo, existe todo um debate, no campo da linguagem inclusiva, que polariza 2 opções: o texto alternativo deve ou não referir a cor da pele das pessoas retratadas numa imagem? A resposta é outra pergunta: o contexto precisa dessa informação?
6. Humanizar a comunicação através da voz ativa
A voz ativa ajuda-nos a escrever menos, usamos menos palavras para descrever um sujeito e a ação que faz. Um texto em voz ativa é, por isso, mais direto, mas também mais humano e conversacional.
Outra vantagem é a facilidade de tradução. Sendo mais curto e direto, esse texto será mais fácil de traduzir para outras línguas.
7. Seguir a gramática
Mesmo que o texto alternativo pareça um simples fragmento de uma frase, aplicam-se as regras da gramática, como maiúsculas iniciais, vírgulas e pontos finais. Assim, os leitores de ecrã vão ler o conteúdo com a entoação e pausas certas.
De fora do texto alternativo devem ficar os emojis, até porque o texto e a pontuação já transmitem qualquer emoção que a imagem mostre.
8. Evitar abreviaturas
De modo geral, evitamos abreviaturas em qualquer tipo de texto por não serem sempre acessíveis. No entanto, quando as usamos, explicamos o seu significado na 1.ª vez que surgem na página.
No caso do texto alternativo, há quem recomende colocar espaços entre cada letra maiúscula da abreviatura, como o guia Polaris, da Shopify. Isso garante que os leitores de ecrã conseguem ler letra a letra, em vez de considerarem a abreviatura como uma palavra.
Mas evitar abreviaturas é a recomendação essencial.
Podemos escrever por extenso o significado da abreviatura. Assim, na página, existe uma versão “visível” da abreviatura, enquanto o código mostra uma versão “invisível”, cuidando que todos os utilizadores podem aceder à informação.
9. Fugir ao óbvio
Um bom alt text foge à descrição óbvia que diz “esta é uma imagem de…”. Para os leitores de ecrã, o código já indica que os utilizadores estão a passar por uma imagem, sem redundâncias.
Evite também usar uma parte do conteúdo da página como texto alternativo — a repetição vai ser notada pelos utilizadores.
10. Preferir linguagem clara
Se calhar, reconhece muitas destas dicas. Elas cruzam-se com as recomendações de linguagem clara.
Na verdade, escrever texto alternativo também deve obedecer às regras de linguagem clara para que este conteúdo seja útil.
Para recordar, linguagem clara é aquela que os utilizadores compreendem ao primeiro contacto, seja a ler ou a ouvir o conteúdo, e conseguem usar essa informação para alcançar o seu objetivo. É uma forma de escrever que prefere palavras simples e rigorosas.
Da próxima vez que publicar uma imagem, lembre-se de escrever um bom alt text. E quanto aos manuais de montagem do IKEA, vale a pena dizer que estão disponíveis no site da loja, em PDF, no seu clássico formato de ilustrações sem legendas. Será que são acessíveis para todos os utilizadores?
O tema dos PDF é outro tópico importante no que toca à acessibilidade. Spoiler alert: evite PDF.